No campo das teorias contemporâneas de liderança, tornou-se quase um dogma afirmar que o bom líder é aquele que não precisa e/ou não pode almejar ser amado por todos. Sob a lógica da performance, da produtividade e da assertividade radical, o amor passou a ser interpretado como fraqueza e a empatia, como concessão emocional. Mas será possível liderar sem afeto? E mais: será possível transformar realidades humanas ignorando a dimensão relacional que habita toda convivência?
Este artigo de opinião propõe uma ruptura consciente com esse paradigma frio e propõe uma reinterpretação da liderança a partir de um olhar ético, espiritual e psicossocial. A figura de Jesus Cristo é tomada como eixo simbólico e prático dessa reflexão — não apenas por seu impacto histórico e religioso, mas como exemplo máximo de um líder que, mesmo sendo forte, buscava e ofertava amor. Jesus não anulava sua autoridade ao desejar ser amado; ele a reforçava por meio da entrega, do cuidado, da escuta e da coragem de dizer o que ninguém queria ouvir.
Ao lado de sua figura, autores contemporâneos como Simon Sinek (2015), Brené Brown (2018) e Daniel Goleman (1995) são acionados para compor um mosaico argumentativo que reconhece: liderar é, antes de tudo, servir com responsabilidade, comunicar com clareza e amar com coragem. O bom líder não é aquele que evita vínculos — é aquele que os fortalece mesmo diante da adversidade.
A visão de que o líder precisa ser emocionalmente neutro para manter autoridade tem se sustentado por ideias herdadas de modelos corporativos do século XX. No entanto, o século XXI exige uma nova postura, em que a autoridade não se baseia no medo ou no distanciamento, mas na confiança, no exemplo e no cuidado. Simon Sinek (2015, p. 41) afirma: “Liderar não é estar no comando. Liderar é cuidar das pessoas sob nosso comando.” A autoridade que inspira é a que protege, e não a que ameaça.
Jesus Cristo representa esse tipo de liderança transformadora. Ele não precisou gritar para ser ouvido, nem se omitir para ser amado. Chorou a morte de Lázaro (João 11:35), lavou os pés dos discípulos (João 13:5) e ensinou com ternura mesmo quando corrigia com firmeza. Seu encontro com o jovem rico é emblemático: olhou para ele com amor e disse algo difícil — “vende tudo que tens” (Marcos 10:21). Essa atitude revela que o amor não exclui a responsabilidade, mas a torna mais verdadeira.
Daniel Goleman (1995), em sua obra sobre inteligência emocional, reforça que líderes emocionalmente conscientes têm mais sucesso em ambientes complexos. A empatia, que por muito tempo foi tratada como virtude passiva, é hoje reconhecida como competência essencial para liderança. E essa empatia começa quando o líder aceita sua própria humanidade — inclusive o desejo de ser amado.
Dizer que o bom líder “não precisa ser amado” ignora um princípio humano universal: todos desejam reconhecimento. Não se trata de vaidade, mas de conexão. Brené Brown (2018, p. 234) afirma que a vulnerabilidade não é fraqueza, mas coragem de estar presente de forma inteira. Um líder que ignora sua própria afetividade, cedo ou tarde, desumaniza sua equipe ou adoece.
Tomemos como exemplo um mecânico que busca ser querido por todos os seus clientes. Esse desejo não o impede de dar diagnósticos difíceis, cobrar por serviços justos ou recusar consertos arriscados. Pelo contrário: sua honestidade se fortalece justamente por estar alicerçada no respeito e no vínculo. O mesmo se aplica ao professor que ama sua turma, mas não hesita em avaliar com rigor — ou ao prefeito que, mesmo cumprindo sua obrigação ao pagar salários em dia, sente-se valorizado ao ouvir: “Parabéns pelo seu compromisso.”
Na liderança de Jesus, vemos esse desejo pela totalidade. Ele não deu a vida apenas por quem o seguia — deu por todos. Mesmo conhecendo a traição de Judas, lavou seus pés (João 13:26). Mesmo sob dor, perdoou: “Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem” (Lucas 23:34). Se o maior líder que já existiu amou a todos — mesmo os que o rejeitaram —, por que o líder moderno não poderia desejar amar e ser amado sem culpa?
Diante de uma sociedade que valoriza cada vez mais resultados do que relações, é urgente revisitar os fundamentos da liderança sob uma ótica mais humana, ética e espiritual. O líder que deseja ser amado não é fraco nem inseguro — é consciente de que seu papel vai além da execução de tarefas: ele constrói sentido, forma vínculos e inspira pelo exemplo.
A figura de Jesus Cristo nos mostra que é possível — e necessário — liderar com coragem e ternura. Amar a totalidade, desejar a reciprocidade, entregar-se por todos sem exceção. A autoridade de Jesus não estava dissociada de sua sensibilidade; era justamente no equilíbrio entre firmeza e afeto que sua liderança se tornava revolucionária.
Autoras como Brené Brown e estudiosos como Goleman e Sinek reforçam o que a fé já ensinava há séculos: a liderança que transforma é a que escuta, que serve, que toca e se deixa tocar. O bom líder não é aquele que impõe distância para manter respeito, mas o que constrói confiança e proximidade para sustentar propósitos coletivos.
Como está escrito: “Eu sou o bom pastor. O bom pastor dá a vida pelas ovelhas” (João 10:11). E se até o Pastor dos pastores nos ensinou que liderar é amar — e amar até o fim —, que todo líder de verdade aceite esse desafio não como fraqueza, mas como sua mais nobre fortaleza. Contudo esse é o ponto do qual acredito e sonho como deve ser a postura de um verdadeiro líder e você? Qual sua opinião?
BÍBLIA. João 10:11; João 11:35; João 13:5; João 13:26; Marcos 10:21; Lucas 23:34. Tradução Almeida Revista e Atualizada.
BROWN, Brené. A coragem de ser imperfeito: como aceitar a própria vulnerabilidade, vencer a vergonha e ousar ser quem você é. Rio de Janeiro: Sextante, 2018.
GOLEMAN, Daniel. Inteligência emocional: a teoria revolucionária que redefine o que é ser inteligente. Rio de Janeiro: Objetiva, 1995.
SINEK, Simon. Líderes se servem por último: como construir equipes seguras e engajadas. Rio de Janeiro: Saraiva, 2015.